Boletim Médico
do Dr. John R. Lee
SALIVA
OU SANGUE, PARA MEDIR
NÍVEIS DE
PROGESTERONA?
Há uma confusão entre
profissionais da medicina e o grande público sobre a
questão
da absorção de progesterona. Essa confusão
geralmente
resulta de uma má interpretação do teste usado
para
medir os níveis de progesterona no organismo. Vamos tentar
esclarecer
o assunto.
Veja neste
artigo:
O
que mede
um exame de sangue
Os exames de "sangue" para medir
progesterona se referenciam à concentração desse
hormônio
no soro sangüíneo ou plasma. O plasma é aquela parte
aquosa, não-celular do sangue, da qual se excluem os componentes
celulares, tais como glóbulos vermelhos e glóbulos
brancos.
Soro sangüíneo é essencialmente o mesmo que plasma,
porém sem fibrinogênios. O soro e o plasma, sendo aquosos,
contêm substâncias solúveis em água
(hidrossolúveis),
como as vitaminas hidrossolúveis, carboidratos e
proteínas.
O soro e o plasma não contêm substâncias
lipossolúveis
(solúveis em gordura). Para fins deste artigo, soro
sangüíneo
e plasma são termos intercambiáveis, aos quais vou me
referir
apenas como plasma. Hormônios sexuais como progesterona,
estrógenos
e testosterona são esteróides lipossolúveis
semelhantes
ao colesterol. Quando você tem uma medida de colesterol no
plasma,
você está medindo colesterol combinado com
proteína,
que o torna hidrossolúvel. (Lembre-se que o colesterol do plasma
é descrito como Colesterol HDL ou Colesterol LDL, conforme a
proteína
a que estiver ligado.)
Como
a progesterona
viaja pelo sangue
A maioria da progesterona produzida
pelo ovário e encontrada no sangue também é
combinada
com proteína. A progesterona combinada com proteína
não
se encontra facilmente biodisponível aos receptores das
células-alvo
no organismo. Ela está a caminho do fígado, para ser
segregada
na bílis. Apenas 2 a 5 por cento da progesterona no plasma
são
"livres", ou não ligados a proteínas. Essa é a
progesterona
disponível para os tecidos-alvo e para a saliva. Assim,
progesterona
medida através de níveis plasmáticos é
basicamente
uma medida de progesterona que não vai ser utilizada pelo
organismo.
Um teste sorológico pode ser usado para comparar a
produção
de progesterona de uma mulher com a produção de outra
mulher,
ou para medir a quantidade de progesterona que está sendo
produzida
pelos ovários de uma mulher.
Quando a progesterona é ministrada
por via intravenosa, 80 por cento dela são absorvidos pelas
membranas
das hemácias, que são de natureza gordurosa e portanto
disponíveis
às moléculas lipossolúveis da progesterona. Menos
de 20 por cento serão encontrados no plasma. Então
é
óbvio que os níveis sorológicos não
detectariam
a maior parte da progesterona acrescentada ao total do sangue.
Absorção
de progesterona transdérmica
A molécula da progesterona
é altamente lipofílica (tem afinidade por gorduras), que
é bem absorvida através da pele pela camada de gordura
subjacente.
Na verdade, ela é um dos hormônios esteróides
humanos
mais lipofílicos. A partir da camada de gordura, a progesterona
vai sendo absorvida gradualmente pelas membranas das hemácias
nos
vasos capilares que passam pela gordura. A progesterona transportada
pelas
membranas dos glóbulos vermelhos torna-se facilmente
disponível
para todos os tecidos-alvo e para a saliva. Essa progesterona é
totalmente biodisponível e facilmente mensurável no teste
de saliva. Apenas uma pequena fração dessa progesterona
é
transportada pelo plasma aquoso. Obviamente, então, o exame
sorológico
não é uma boa maneira de se medir a
absorção
de progesterona transdérmica.
No entanto, muito médicos
continuam questionando a absorção de progesterona via
pele.
Um exemplo recente disso é um relatório na
edição
de 25-4-98 da Lancet, dizendo que exames sorológicos não
refletiram um acréscimo substancial de progesterona após
aplicação tópica em mulheres na
pós-menopausa.
Esse relatório está sendo utilizado como argumento de que
a progesterona não é bem absorvida. Essa
implicação
é errônea. Pelo contrário, isso significa que os
autores
não entenderam a significativa diferença entre
níveis
sorológicos e de saliva. Alguns até sugerem que o teste
da
saliva é relativamente desconhecido e que a sua confiabilidade
não
está comprovada. Essa é uma curiosa
colocação,
pois os pesquisadores têm usado testes de saliva há anos e
vários laboratórios oferecem testes hormonais rotineiros
de saliva. Exemplos de referências que dão suporte a todos
os pontos importantes deste assunto se encontram no final desta
matéria.
O
TESTE DE
SALIVA PARA MEDIR A DOSAGEM DE PROGESTERONA
O segredo é obter o
equilíbrio
O propósito da suplementação
com progesterona é restaurar os níveis
fisiológicos
normais de progesterona biodisponível. O segredo é o
equilíbrio
entre progesterona e estrogênio. Quando um número
suficiente
de mulheres que ovulam normalmente é analisado por testes
hormonais
de saliva, a faixa característica encontra-se entre 0,3 e 0,5
ng/ml.
Em circunstâncias normais, não há razão para
que esses valores sejam ultrapassados.
Na minha experiência, a dose
tópica necessária para se atingir um nível salivar
de 0,5 ng/ml fica geralmente entre 12 e 15 mg por dia. Para cremes que
contenham de 900 a 1000 mg por embalagem de 56 gramas, 12 a 15 mg por
dia
durante 24 dias consumiriam apenas cerca de um terço desse
conteúdo.
Doses mais elevadas são geralmente usadas inicialmente, para
superar
o estado de deficiência de progesterona, porém a dose de
manutenção
dever ser em torno de 15 mg por dia. Como uma considerável
variação
de progesterona é bem tolerada, uma modesta
elevação
nos níveis de saliva até 0,8 ou 1,5 ng/ml é
aceitável.
Níveis
de progesterona e TPM
Níveis de progesterona na
saliva várias vezes maiores que 0,5 ng/ml se justificam em
certas
situações. Na TPM, por exemplo, o stress geralmente
é
um fator. O stress aumenta a produção de cortisol. O
cortisol
bloqueia alguns receptores de progesterona e, assim, impede a
função
desse hormônio. Para enfrentar esse bloqueio do cortisol, o uso
de
progesterona tópica na faixa de 30 a 40 mg/dia às vezes
é
inicialmente necessária para se obter um efeito
benéfico.
Progesterona
e endometriose
Da mesma forma, em mulheres com
endometriose o objetivo é elevar o nível de progesterona
até aquele encontrado em mulheres com dois meses de gravidez.
Esse
nível poderá exigir uma suplementação de
progesterona
tópica na faixa de 30 a 50 mg por dia, do 8º dia até
o 26º dia do ciclo menstrual. (Ver o Boletim Médico John
Lee
de julho/98 para maiores detalhes sobre causas e tratamento da
endometriose).
A dosagem de progesterona é
determinada basicamente pela resposta: a dose certa é aquela que
resulta em diminuição progressiva das dores da
endometriose.
Quando a maior parte da dor tiver desaparecido, os níveis podem
ser gradualmente diminuídos, com o tempo, para doses
necessárias
apenas para manter o benefício da progesterona.
Progesterona
e os receptores de estrogênio
Nas mulheres a quem seus médicos
estão ministrando doses excessivas de estrogênio, um
problema
diferente precisa ser enfrentado. O excesso de estrógenos em
circunstâncias
de progesterona deficiente induz uma diminuição na
sensibilidade
dos receptores. Um das funções da progesterona é
restaurar
a sensibilidade normal dos receptores de estrogênio. Quando a
progesterona
é restaurada, a sensibilidade dos receptores de estrogênio
também é restaurada. Não chega a causar surpresa,
nesses casos, algumas mulheres desenvolverem sintomas de
predominância
estrogênica (retenção de líquidos, dores de
cabeça, aumento de peso, seios inchados) no início da
suplementação
com progesterona. Obviamente, a dose de estrogênio deve ser
diminuída.
Se isso for feito de forma muito rápida, no entanto, podem
ocorrer
fogachos. O segredo é reduzir o estrogênio gradualmente
enquanto
a progesterona estiver sendo restaurada.
Na minha experiência, a dosagem
de estrogênio pode ser reduzida em 50 por cento logo que a
progesterona
for acrescentada. Então, a cada 2 ou 3 meses, a dose de
estrogênio
pode ser ainda mais reduzida, gradualmente. Muitas mulheres vão
acabar descobrindo que elas não precisam de nenhuma
suplementação
de estrogênio: o estrogênio normalmente produzido pela
gordura
encontrada no organismo da mulher na pós-menopausa é
geralmente
suficiente para suprir suas necessidades quando a progesterona é
restaurada.
Testes hormonais
de saliva usados por pesquisadores
- Painter-Brick C, Lotstein DS, Ellison
PT. Sazonalidade da função reprodutiva e perda de peso
nas
mulheres nepalesas da zona rural. Hum Reprod May 1993; 8 (5): 684-690.
- Ellison PT, Painter-Brick C, Lipson
SF, O'Rourke MT. O contexto ecológico da função
ovariana
humana. Hum Reprod Dec 1993; 8 (12): 2248-2258. Ellison PT.
Medição
de progesterona na saliva. Ann NY Acad Sci Sept 20 1993; 694:
161-176.
- Campbell BC, Ellison PT. Variação
menstrual da testosterona na saliva entre mulheres com ciclos
regulares.
Horm Res 1992; 37 (4-5): 132-136.
- Lipson SF, Ellison PT. Valores
de referência para "progesterona" lútea medida por
radioimunoteste
salivar. Fertility and Sterility May 1994; 61 (3): 448-454.
- Bloom T, Ojanotko-Harri A, Laine
M, Huhtaniemi I. Metabolismo da progesterona e da testosterona em
glândulas
parótidas e salivares submandibulares humanas in vitro J Steroid
Biochem Mol Biol Jan 1993; 44 (1): 69-76.
- Boas provas da absorção
de esteróides através da pele humana. Johnson ME, et al.
Permeação de esteróides através da pele
humana.
J Pharmaceutical Sci 1995; 84: 1144-1146.
- A prova do transporte de progesterona
pelo glóbulo vermelho. Devenuto F, et al. Membrana do
eritrócito
humano: Absorção de progesterona e
alterações
químicas. Biochim Biophys Acta, 1969;193:36-47. Koefoed P, Brahm
J. Permeabilidade da membrana da hemácia humana aos
hormônios
esteróides sexuais. Biochim Biophys Acta 1994; 1195: 55-62.
- Comparação direta
dos níveis de plasma e saliva após
aplicação
tópica de progesterona. Dollbaum CM, Duwe GF.
Absorção
de progesterona após aplicação tópica:
níveis
no plasma e na saliva. Apresentados na Sétima Reunião
Anual
da Associação Norte-Americana da Menopausa, 1997.
A última referência
acima é particularmente reveladora. Cremes com
concentrações
variáveis de progesterona foram aplicados em mulheres na
menopausa,
após o que os níveis no plasma e na saliva foram medidos.
Os resultados estão ilustrados abaixo:
Creme
c/Progesterona
(dose
diária)
0 mg
0.34 mg
30 mg
|
Plasma
(ng/ml)
0.36 +
0.06
0.50 + 0.09
1.8 + 0.3
|
Saliva
(ng/ml)
0.03 + 0.006
0.152 + 0.025
8.7 + 3.5
|
Como pode ser visto, nas mulheres
que receberam um placebo na forma de creme tópico o nível
do plasma foi mais de 10 vezes maior que o da saliva. Isso indica o
quão
pouco da progesterona no sangue era do tipo não ligado a
proteínas,
ou biodisponível.
Quando apenas 0.34 mg de progesterona
foi aplicado topicamente, o nível do plasma subiu 39 por cento,
enquanto o nível da saliva subiu 5 vezes. Isso indica que apenas
uma pequena quantidade da progesterona acrescentada entrou no plasma,
ao
passo que a saliva mostrou claramente um grande incremento de
progesterona
biodisponível. Quando uma dose 88 vezes maior foi aplicada
topicamente,
o nível do plasma subiu apenas 3,6 vezes. enquanto o
nível
simultâneo da saliva aumentava 57 vezes. Isso indica que apenas a
saliva refletiu o grande incremento da progesterona
biodisponível
absorvida. A progesterona encontrada na saliva era obviamente
transportada
pelo sangue, porém deve ficar óbvio que a parte do sangue
que transportou a progesterona não era o plasma (soro), mas sim
via glóbulos vermelhos.
Em todas as situações,
porém, deve ficar claro que os níveis de progesterona no
plasma não são um indicativo do nível real de
progesterona
biodisponível, como aquele obtido através da
aplicação
tópica. Os níveis de saliva são bem mais
apropriados
para este fim.
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